março 04, 2014

A carta

Reabriu o envelope pela milésima vez, pegou o papel já amarelado e desgastado pelo tempo, mas ainda perfumado, perfume que só ela sentia.
Nunca antes eu havia notado como a ausência de palavras poderia ser também tão significativa.  Aquela era a ultima carta recebida, em resposta a ultima enviada.
Francesca lhe escrevera sobre seu amor, em palavras bonitas, letras desenhadas, no papel pequenas flores azuis e o perfume de rosas que tantas vezes embriagara de amor, Antonio.
Talvez por todas as lembranças que aquele envelope lhe trouxe se explique a falta das palavras e, todo o sentimento que aquele espaço aparentemente vazio remetia.
O espaço em branco trouxe o impacto do nada a dizer, porém trouxe também a certeza de que a emoção fora tanta que não existiram no momento palavras bastantes para expressar o sentimento. Como aquele silêncio que se dá após o beijo, após o adeus. Para sempre seu foi a lágrima ultima. Lágrima de quem diz eu te amo, mas... E tudo o que cabe no espaço entre o “mas” e o que puder vir depois. Percebe quanto sentimento pode caber no vazio das palavras?
Não sei quem foram Francesca e Antonio, a carta encontrei em um livro que comprei em uma viagem.  Quem quer que tenham sido me ensinaram quanto sentimento pode caber naquilo que não é dito.

Veneza, Outubro 1902.

Francesca, amada minha.
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Sem palavras.
                                                                                            Para sempre seu, Antonio.




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